“ Fazer música a metro nunca foi o meu estilo”
Fernando Girão regressa com um novo álbum, em que dá voz e ritmo a alguns dos mais simbólicos temas brasileiros. O Músico apresenta este último trabalho no Domingo, pelas 17 h00, na Fnac Coimbra.Joana MartinsDiário de Coimbra16.04.2010DC Magazine:
Lançou recentemente o álbum Brazil-a-tribute. Como nasceu este disco?Fernando Girão – Este Cd é de facto um tributo ao Brasil e eu decidi fazê-lo porque sou brasileiro e vivi lá até aos 16 anos.A Minha escola foi desde novo o jazz e a música brasileira e durante muitos anos ganhei a vida a cantar precisamente música brasileira. No entanto, quando comecei a compor os meus próprios temas, nunca mais me dediquei a este género musical de que tanto gosto.
Entretanto estive alguns anos parado e durante esse período compus vários discos, entre os quais este cd duplo de tributo ao Brasil e de homenagem a grandes compositores e artistas brasileiros.
DCM –
Dada a riqueza da música brasileira, foi difícil decidir que temas seriam incluídos neste trabalho?Fernando Girão – Foi uma escolha muito difícil. A música brasileira é tão rica e tem composições tão boas, que não foi fácil decidir no meio desta enorme fonte de riqueza cultural. Basicamente eu peguei em 100 baladas e demorei dois meses a escolher os dez temas finais que agora compõem odisco um do meu álbum. Quanto ao disco dois foi mais ou menos o mesmo processo, mas com sambas e aqui eu fui pesquisar desde os anos 30 até aos dias de hoje. Aos sambas que escolhi dei uma produção nova e diferente. Apesar da dificuldade, fiquei muito satisfeito com o resultado.
DCM – Já têm tournée agendada para apresentar este disco?Fernando Girão – Ainda não, uma tornée é sempre complexa de organizar, mas estamos a trabalhar nisso e talvez estejamos na estrada dentro de dois ou três meses.
DCM – Já apresentou o álbum em showcases… Como tem sido o feedback do público?Fernando Girão – A reacção tem sido fantástica. As actuações que tenho feito sou apenas eu e um músico no violão e o público reage como se estivéssemos num concerto. Sente-se um grande prazer nas pessoas que assistem ao espectáculo e as Fnac têm estado completamente cheias e tenho terminado sempre com as pessoas a aplaudirem de pé e a pedir encore.
DCM – Dada a sua origem retira maior prazer da interpretação de temas da música brasileira?Fernando Girão – Não. Considero-me um homem do mundo, mas o que acho é que certas músicas, nos dão mais oportunidade de viajar com elas e de ter uma atitude mais enérgica, como é o caso dos sambas, que têm um ritmo inerente. Penso que esse balanço da música brasileira é que provoca uma energia extra em mim.
DCM – Porque decidiu retirar-se nos últimos sete anos?Fernando Girão –Estive sete anos retirado porque fazer música a metro nunca foi o meu estilo. Devo respeito à arte que me foi concedida e procuro sempre ter uma mensagem naquilo que faço chegar ao público. O Pedro Abrunhosa no prefácio do meu livro escreveu algo que penso que define muito bem essa minha característica. Ele diz que há 20 anos atrás ninguém se preocupava com a camada do ozono e eu já cantava sobre essas temáticas. Isto para dizer que eu preciso de parar para pensar nas coisas e durante estes sete anos produzi sete discos, que são intemporais, e que vão sair entretanto.
DCM – Tem então mais cinco discos prontos para serem lançados. Pode adiantar o que serão esses projectos?Fernando Girão – Um deles será lançado até ao final de ano e diz respeito a um projecto muito forte que criei com um músico luso-alemão. Terá o nome de Grupo de Combate Urbano e aposta num género muito forte de rock, cujos temas retratam a realidade dos nossos dias. Não tem nenhum tema de amor, apenas canções acerca do que a humanidade está a passar neste momento e surgiu porque eu e o Luís Vicente percebemos a determinada altura que não existia actualmente nenhuma banda que, do princípio ao fim, focasse apenas a condição humana e os tempos difíceis que ela vive. No espectro do nosso país havia tantos cantautores que lutaram pela liberdade e, depois da revolução do 25 de Abril, a impressão que tenho é que ninguém sentiu necessidade de dizer mais nada sobre o mal que continua a existir. Claro que existem muitos projectos, sobretudo de rap, que dão voz a temas de intervenção, mas não um disco inteiro apenas sobre isso e é essa lacuna que o Grupo de Combate Urbano quer preencher.
DCM – E os restantes trabalhos?Fernando Girão – Outro dos trabalhos que produzi é um disco com piano e voz apenas. Além disso lançarei ainda um projecto inteiramente gravado num novo idioma sonoro que ando a inventar há 16 anos. Depois tenho também um trabalho com um cantor americano muito famoso cujo nome não vou ainda revelar.
DCM – Como vê aquilo que tem sido feito na música portuguesa?Fernando Girão – Tenho um certo constrangimento e até vergonha de olhar o panorama nacional, porque há tantas coisas novas a acontecer e sinto um grande pesar e tristeza em perceber que parece que os portugueses não gostam do que é seu.
As rádios portuguesas, salvo raras excepções, não passam música nacional e nos tops de vendas vemos uma esmagadora maioria de música estrangeira. Penso que isso é uma falta de respeito por nós mesmos. Ainda assim parece-me que hoje em dia as pessoas têm uma ânsia muito grande de coisas diferentes. Estão fartas da massificação e querem ver e ouvir em palco artistas que lhes apresentem algo de novo. Acho que a diferença está aí: o publico está mais consciente do que quer e anseia pela qualidade emocional da música que chega até si.
DCM – O que vamos ver na Fnac este domingo?Fernando Girão – Este domingo vou dar o meu melhor e vai ser uma festa, portanto o apelo que faço é de que venham comemorar connosco!